quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Aferir, depressa e em força

O novo Ministério da Educação produziu, em tempo quase recorde, um novo modelo de avaliação externa dos alunos do Ensino Básico. Seja porque já estava preparado previamente, seja porque era necessário reagir à revogação parlamentar das provas finais do 4.º ano e ao vazio criado, o novo modelo apresenta uma interessante coerência interna que assenta numa regular aferição das aprendizagens ao longo do Ensino Básico (de 3 em 3 anos de escolaridade e uma vez por ciclo), culminando em provas finais apenas no seu ano terminal.

Vou começar por destacar os pontos que acho mais positivos de mais esta reforma no sistema de avaliação dos alunos, neste caso da componente externa:

1) A realização de uma aferição regular das aprendizagens é um instrumento útil, desde que todos os envolvidos (de alunos aos órgãos de gestão das escolas, passando por professores e encarregados de educação) a levem a sério e entendam que pode ser um instrumento de regulação do progresso do desempenho dos alunos, de despiste precoce (no caso da prova no 2.º ano que eu preferiria ver apenas no 3.º ano) de situações de maiores dificuldades e de reorientação de estratégias de ensino e não como uma formalidade a ultrapassar ou tornear pela via mais fácil por “não contar para nada”. Seria estranho criticar as provas finais por contarem para a avaliação final e depois desvalorizar provas com uma função essencialmente formativa.

2) A rotatividade das áreas e disciplinas que são objeto de aferição são uma excelente ideia, pois não podemos reduzir a avaliação das aprendizagens em todo o Ensino Básico ao saber ler, escrever e contar, para além de que isso sempre se traduziu num desequilíbrio substancial na responsabilidade de alguns grupos disciplinares em relação aos resultados que as escolas apresentavam para o exterior. O trabalho, por exemplo, em Ciências, História ou Inglês também merce ser aferido e isso não deve ser encarado com receio, mas como uma (re)valorização do seu papel no currículo.

3) A deslocação das datas das provas para a semana final das aulas ou para a época de exames do Ensino Secundário é uma decisão muito acertada e só pode merecer elogios, pois reduz imenso a disrupção que a realização de provas a meio de maio provocava nas escolas e no trabalho com os alunos.

4) Por fim, a suspensão (esperando eu que eliminação) da prova de Inglês made in Cambridge é outra decisão a merecer aplauso, em especial se a aferição incidir, como está anunciado, com regularidade também sobre a disciplina de Inglês. A sua introdução pareceu-me, desde o seu anúncio, uma medida postiça, típica de um certo pseudo-cosmopolitismo e com contornos financeiros algo difusos.

Agora, os pontos que acho negativos nesta nova reforma:

1) A introdução de uma prova no final do 2.º ano parece prematura (mesmo se existe em outros países) se não for enquadrada em medidas destinadas a melhorar o apoio aos alunos que indiciem precocemente maiores dificuldades. E isso não se compadece com estratégias que permitam a não realização de tais provas por esses alunos.

2) Não me parece aceitável sem forte crítica a alteração de regras no início do 2.º período de um ano letivo que foi planificado (tal como o próprio ciclo) há meses para ter provas finais no 6.º ano. Porque, a título de exemplo, sou dos que defendem a concentração de atividades, em especial as extracurriculares, no 5.º ano, libertando as turmas de 6.º, a partir deste período de meio do 2.º período, de muitas dessas iniciativas por ser necessário ter os conteúdos lecionados e consolidados a meio de maio. Agora, assim num repente, os alunos de 5.º ano têm prova e os de 6.º, não. O razoável seria ter mudado este ano apenas o calendário das provas e não o ano de escolaridade a que se aplicam. Para além disso, desta forma, há todo um grupo de alunos que fizeram provas finais de primeiro ciclo no ano passado e farão este ano as de aferição do 5.º ano, enquanto os do 6.º ficarão livres até ao 8.º ano. Parece-me uma má decisão. Já que este ano não se realizam provas de final do 1.º ciclo, deveriam ser esses alunos a estrearem as de 5.º ano.

Anunciar em janeiro de 2016 um novo e completo modelo de avaliação a implementar em 2016/17 não seria criticável. O princípio de não mudar regras com o 2.º período já iniciado é, para mim, válido para qualquer governo e ministro, seja qual for o seu partido ou maioria de apoio. Tudo poderia ter obedecido a um cronograma coerente que não manchasse, devido à pressa, algumas boas ideias.

Por Paulo Guinote

Professor do 2.º ciclo do Ensino Básico

Fonte: Público

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